"Ela". A tatuagem de Linn da Quebrada localizada na testa da cantora e atriz deveria ser o suficiente para que todos os brothers e sisters do "BBB22" entendessem como se referir à colega de reality show. Mas, muitos participantes do programa da TV Globo ainda tem dificuldade em respeitar sua identidade de gênero e tratá-la como deveriam. Culpam suas experiências de vida, educação ou o fator "automático". Tudo isso para não usar uma simples letra, que faz toda a diferença. Só que isso não pode ficar assim.
Linn da Quebrada aceita ser identificada por pronomes femininos. Então, quando se referir à sister, é só usar os pronomes e palavras no feminino, assim como utilizamos quando nos referimos à qualquer mulher cisgênero. Não errar os pronomes de Lina é o mínimo a se fazer para respeitar, legitimar e aceitar sua existência. No país que mais mata travestis e transexuais do mundo, tratar Lina do jeito que ela gostaria de ser tratada é garantir o básico de seu direito como cidadã. Pode parecer não fazer diferença para muitas pessoas, mas para ela significa muito. E não é tão difícil assim, né?
Uma dúvida que surgiu logo após Linn fazer sua apresentação no "Big Brother Brasil" quando chegou na casa foi: qual seria a diferença entre mulheres trans e travestis? Lina, como ela mesma diz, não se identifica como homem, nem como mulher, mas sim como travesti. Em um vídeo postado pela criadora de conteúdo e cantora Aline Durso, ela explica que travesti é uma identidade política feminina e latino-americana. Muitas travestis não se identificam como mulheres e sim como algo fora desse espectro binário (o padrão homem/mulher), diferente de mulheres trans.
Então, ao contrário do que muitos pensam, a diferença entre travestis e mulheres trans não está relacionado ao fato de se sentir confortável com sua genitália ou algo assim. "Travesti não é aquela que não quer fazer a cirurgia e mulher trans não é a que quer fazer. A diferença entre os dois termos não está nisso", ressalta Durso.
Aline ainda explica que essa justificativa foi criada por pessoas cisgêneros (que se identificam com o gênero que é imposto ao seu nascimento) para definir quem são pessoas trans e travestis a partir de suas percepções. Muitos ainda têm uma visão pejorativa das travestis, enxergando-as como sujas, drogadas, sempre ligadas à prostituição etc. Enquanto mulheres trans seriam aquelas que tentariam ao máximo "esconder" sua genitália e se assimilar a uma mulher cis. Nenhum dos dois é verdade.
Hoje em dia, as pessoas se encontram nessas identidades de gênero por conta de autoidentificação. "Trata-se de questão de autodeterminação, de reconhecimento da sua identidade, de recortes raciais e históricos", finaliza.
Infelizmente, desde que chegou na casa do "BBB22", Linn da Quebrada sofreu diversas formas de violência e transfobia. Rodrigo chegou a questioná-la se o termo "traveco" seria ofensivo - a resposta é sim, para aqueles que ainda não saibam ou sintam isso nas suas falas -; Eliezer contou uma história bem problemática sobre um amigo que teria se relacionado com uma travesti; e Eslovênia, Laís e outros participantes já erraram os pronomes de Linn diversas vezes.
Isso significa que nem em um reality show de escala nacional pessoas trans e travestis deixam de sofrer transfobia.
Por isso é importante combatermos esse tipo de discurso violento e agressivo e sermos aliades na luta das pessoas trans e travestis. Um exemplo positivo disso foi Tadeu Schmidt, o novo apresentador do programa, dar a oportunidade de Linn reforçar os seus pronomes e explicar sua tatuagem "Ela" para o Brasil ouvir, assim como seus colegas de casa. Além disso, o apresentador ainda reforçou a necessidade de não errarmos seus pronomes, como já não deveríamos estar fazendo.
Linn da Quebrada é a primeira participante travesti do "Big Brother Brasil". Antes dela, Ariadna, mulher trans, participou do reality em 2011, sendo a primeira eliminada daquela edição. Recentemente, a ex-BBB compartilhou um vídeo que compara o preconceito sofrido por ela naquela época e o que está acontecendo com Lina agora.
Esperamos que daqui a 11 anos não seja necessário escrever outro texto como esse e nem que haja tanta transfobia no "BBB" e no resto do mundo. Também temos esperança de que a próxima participante trans/travesti do reality não apareça só depois de mais uma década de programa.