Com a estreia do drama nacional "A Frente Fria Que a Chuva Traz", esta quinta-feira (28) fica marcada como nada menos que o retorno do cineasta Neville D'Almeida às telonas brasileiras. Afastado desde o lançamento de "Navalha na Carne", em 1997, o diretor prova que está longe de abandonar os traços do cinema marginal, conhecido por seu radicalismo extremo, e que ainda consegue fazer jus a sua reputação.
Porém, apesar de suas intenções ousadas, falta coragem nas escolhas pelas quais a trama acaba sendo narrada. Logo de início, proposital ou acidentalmente, o filme se revela, até para os desavisados, uma verdadeira adaptação cinematográfica da peça de mesmo nome escrita por Mario Bortolotto. As típicas cenas de apresentação dos núcleos e personagens, os diálogos artificiais e as entonações exageradas dos atores trazem ao espectador a sensação de terem confundido a sala de cinema com uma de teatro.
Na mais pura forma de retrato da sociedade e sem a menor pretensão aparente de produzir alguma moral da história, o enredo narra a vida de um grupo de jovens ricos que aluga uma laje na favela carioca do Vidigal para compensar - ou, pelo menos, tentar - seus tédio e futilidade com festas regadas a álcool e drogas.
O contraste fica por conta dos moradores do morro, indecisos entre julgar e invejar os hábitos dos amigos do "asfalto" , e de Amsterdam, jovem pobre interpretada com maestria por Bruna Linzmeyer, que faz de tudo, inclusive favores sexuais, para conseguir manter o seu vício em entorpecentes.
Além de Bruna, que aposta em uma performance diferente da qual os espectadores já estão acostumados a ver nas novelas da Globo, outros integrantes do elenco também se destacam por suas atuações. Incluindo Johnny Massaro, amigo pessoal da protagonista, que impressiona na pele do que parece ser o líder do grupo, e Chay Suede, responsável pelas raras risadas do público durante a exibição do longa-metragem.
A ironia da obra se dá, justamente, pela inesperada prudência em expor a realidade em toda sua clareza. Em contrapartida à verborragia de palavrões e expressões pornográficas, o cineasta opta por mostrar uma violência contida, que prefere limitar, por exemplo, uma possível cena de estupro a simples ameaças por parte dos agressores.
Por fim, é bem provável que "A Frente Fria Que a Chuva Traz" e sua metáfora nada convincente falhem no propósito de causar reflexões e, em vez disso, provoquem no público um sentimento que beira ao mal-estar.