Quem assistiu "Os Três Mosqueteiros", em exibição desde 5 de abril, saiu empolgado dos cinemas. Uma nova adaptação do clássico de Alexandre Dumas, leitura obrigatória da literatura do século XIX, que se concentra especialmente no personagem de D'Artagnan, interpretado por um François Civil aventureiro, cheio de charme e irreverência... Um companheiro de viagem ideal.
Sim, mas é outro Mosqueteiro que nos intrigou: Porthos. Interpretado por Pio Marmai, o irmão de armas de Athos e Aramis se destaca. Por quê? Porque o diretor Martin Bourboulon e seus roteiristas, Alexandre de La Patellière e Matthieu Delaporte, escolheram retratar um Mosqueteiro... Bissexual.
Entendemos isso em três cenas, quando Porthos divide sua cama com uma mulher e um homem (não há ambiguidade aqui) e em algumas respostas bem sacadas: "Se Porthos te pega sob sua asa, é porque ele te quer em seu ninho", "Se ele fosse menos gordo, eu o empalaria bem", "Uma coxa é uma coxa"...
Não é necessário ser Sherlock Holmes para fazer deduções. Porthos, bissexual? Sim. Um elemento que certamente irritará os reacionários - e no Twitter, isso não falhou. Mas essa trama realmente trai a obra original? Ou não é relevante em relação à sociedade atual?
Perguntamos a uma especialista...
"Pode-se muito bem interpretar dessa forma"
Porthos já era bissexual na escrita de Alexandre Dumas em 1844?
Sarah Mombert, professora de literatura francesa do século XIX na École Normale Supérieure de Lyon e diretora da edição online dos jornais de Alexandre Dumas, é enfática: absolutamente não.
Mas, como você pode imaginar, a resposta merece ser aprimorada. "Dumas nunca sugere isso. Mas ainda assim, pode-se interpretar assim... Na verdade, essa ideia está completamente dentro da lógica do personagem. Não há nada absurdo em pensar que Porthos poderia, por exemplo, ser atraído por D'Artagnan...", continua a especialista.
Na obra de Dumas, Porthos se casa com uma viúva rica por motivos puramente financeiros. Ele não sente atração por ela. Da mesma forma, nunca se vê Porthos com uma amante, enquanto seus companheiros sempre estão associados a conquistas femininas. D'Artagnan, por exemplo, é um sedutor brutal e cínico. Mas, ao contrário deste último ou de Athos, o caráter de Porthos nunca é definido através de seu relacionamento com as mulheres..."
"Não é ambíguo, mas poderia se tornar".
Mas então, como definir Porthos?
Simples: como um bom vivant, que não é indiferente aos prazeres da vida. No entanto, à imagem dos companheiros que o acompanham, é ainda o coletivo que melhor o caracteriza. E é aí que "Os Três Mosqueteiros" se apresenta como uma obra propícia a todas as "fan fictions", essas reescritas de fãs erotizadas: é um relato de amizades masculinas, viris, uma "bromance" em suma... Esse americanismo que designa os laços fortes que podem unir os caras entre si, nos filmes de ação ou "buddy movies", por exemplo.
Porque o que une nossos Mosqueteiros, em suas peripécias, suas quedas e suas vitórias, esse famoso "Um por todos, todos por um!", é quase mais intenso em si do que uma história de amor heterossexual tradicional.
Sarah Mombert insiste na importância do grupo: "Há o que os Mosqueteiros dizem, mas também o que eles não dizem, a forma como interagem entre si. Relações entre homens que não são ambíguas, mas poderiam perfeitamente se tornar. Um grupo em que Porthos representa a fidelidade".
"Estes são personagens livres!"
"A modernidade da nossa adaptação começa desde a escrita. Por exemplo, a sexualidade mais desinibida de Porthos faz com que ele seja bissexual no filme. O que não existe no romance", comemora o diretor Martin Bourboulon nas páginas do jornal Ouest France. Moderno, tudo bem, mas isso é realmente pertinente para quem aprecia os clássicos do século XIX?
Mais uma vez, nosso especialista não duvida disso: "Quando Dumas escrevia seus romances históricos, ele tinha plena consciência de que a psicologia de seus personagens era moderna. Portanto, não há nenhum problema em adaptar os costumes dos personagens às questões que são nossas. Além disso, Dumas já retratou relacionamentos homossexuais. Penso em Eugénie Danglars em O Conde de Monte Cristo, por exemplo: filha do barão Danglars, Eugénie é lésbica e foge com sua amiga".
E se essa adição, longe de estar fora de lugar, fizesse totalmente jus às intenções do autor? Vamos lá, ousar dizer: e se esse Porthos fosse "muito Dumas", não importa o que os espíritos estreitos digam? Afinal, como explica Sarah Mombert: "Dumas gosta de personagens que são autônomos, escolhem sua vida, não são restritos pelas regras do que os outros vão dizer. Na verdade, são personagens livres!".
Uma liberdade que nos lembra que o sentido das melhores obras é como os personagens carismáticos que as investem: nunca estático, sempre fluido.