"Abracadabra" foi extremamente marcante para as crianças dos anos 1990 e todas aquelas que assistiram o filme anos depois. Até hoje, o visual das bruxas, os efeitos especiais e a forma como ele marcou o Halloween são referenciados. Quando a Disney anunciou que revisitaria o clássico quase 30 anos mais tarde, muites tiveram dificuldade de entender o motivo para isso. Nós, que já assistimos ao longa, viemos assegurar que essa dúvida é respondida com a história brilhante, atual e revolucionária retratada pela continuação da produção.
Em "Abracadabra 2", que se passa 29 anos depois da versão original, as irmãs Sanderson conseguem retornar a Salem em busca de vingança depois que alguém acende a Vela da Chama Negra na véspera do Dia de Todos os Santos. Para tentar salvar as pessoas que amam, Becca (Whitney Peak) e Izzy (Belissa Escobedo) se unem para impedir os planos de Wini (Bette Midler) Sarah (Sarah Jessica Parker) e Mary (Kathy Najimy), mas acabam tendo muitas surpresas e se reencontram com uma antiga amiga durante essa jornada.
O retorno do trio de bruxas mais querido da cultura pop tem um objetivo: responder criticamente os pontos principais do clássico de 1993. "Abracadabra 2" não nega o seu passado, mas mostra como o tempo voou e o mundo evoluiu.
Seja revelando a origem dos poderes das antagonistas nos tempos medievais ou colocando a nova geração de garotas para bater de frente com as mais antigas, o filme acerta em cheio em mostrar como uma história sobre bruxas deve ser contada hoje em dia - sob o filtro da Geração Z e em uma era que se passa após tantas conquistas do movimento feminista.
Sem entregar tantos spoilers, podemos dizer que mesmo homens cisgêneros que detém todos os seus privilégios - como este que vos escreve - conseguem reconhecer os acertos que o feminismo trouxe para a sociedade e a forma como isso se reflete na continuação de "Abracadabra". Se antes a busca das bruxas era por juventude eterna, agora elas querem poder e, mais do que isso, a chance de terem suas irmãs ao seu lado.
Dentro disso, o título critica tudo aquilo que as vilãs da história original buscam. Aqui, o que importa para as bruxas não é garantir o velho e batido mito de que as mulheres que conseguem dons mágicos vão atrás de juventude eterna, como se esconder suas idades fossem os únicos - e mais urgentes - objetivos femininos. E pra que magia, se já temos toda uma indústria voltada a perpetuar o patriarcado ao reforçar a necessidade imposta de que meninas precisam ser belas a todo custo?
Dando razão para um dos lemas mais celebres da obra de 1993, conhecimento realmente pode ser mais forte e poderoso que magia. Em um mundo que está cercado de produtos voltados para a indústria da beleza e que cultua padrões cada vez mais inatingíveis, nem mesmo dons mágicos são o suficiente para manterem o ideal buscado pelas pessoas. Por essas questões, a premissa é batida. Então, o novo objetivo de Wini e suas irmãs é outro: poder.
Quebrando promessas e deixando para trás um passado para dar lugar ao futuro - como resume bem uma cena muito divertida em que as "originais" perdem um concurso de fantasia de se vestirem como elas mesmas para um grupo de jovens -, a busca para se tornar uma bruxa absurdamente poderosa é o que move Wini. Ainda que a personagem de Bette Midler não se preocupe em saber o custo para o que tanto deseja.
Por fim, a mensagem que "Abracadabra 2" quer passar é clara, genial e importante. Os tempos mudaram e os valores também. Não dá mais para contarmos a mesma história sobre temas voltados aos interesses masculinos, enquanto o universo feminino já se emancipou. Elas têm suas próprias narrativas.
Colocando uma cereja no bolo com toque de magica, a história decide bravamente explorar outras camadas dessa temática. A continuação defende que a coisa mais importante não é o poder para as mulheres, mas sim o que elas fazem com ele e, além disso, quem está do seu lado para usá-lo. Assim, ela fala abertamente sobre sororidade e exalta o sagrado feminino, sem que isso se dê de forma panfletária ou extremamente expositiva.
Com boas doses de comédia, o mesmo brilhantismo das atuações de Midler, Parker e Escobedo que o sucesso dos anos 1990 e acompanhado de uma trilha sonora que dramatiza todo o terror que o longa se diverte tentando explorar, "Abracadabra 2" se coloca como um dos filmes mais feministas do ano e mostra como um grande estúdio como a Disney pode acertar ao querer explorar mais a fundo uma trama já conhecida.
Entre a nostalgia e a magia, "Abracadabra 2" respeita seu passado e abre os braços para o futuro. Aceitando despedidas, o título demonstra coragem ao refletir tudo aquilo que a gente já conhece, ao mesmo tempo que ressignifica um conto que de infantil não tem nada. Se nos anos 1990 o maior terror poderia ser a caracterização horrenda das antagonistas, agora o verdadeiro vilão foi finalmente desmascarado e prova que sempre esteve lá.
Só que diferente de "Abracadabra", na vida real ainda não há palavra mágica para acabar com um mundo dos homens. Além disso, quem quer que o combata está a mercê de ser reconhecida como uma bruxa, mas o que o título realmente te faz questionar é: o que tem de ruim nisso?
"Abracadabra 2" estreia no dia 30 de setembro no serviço de streaming Disney+.