Você realmente sabe para que servem as cotas raciais? Antes de dizer que é uma forma de prejudicar pessoas brancas, vitimizar a comunidade negra ou de escancarar ainda mais o racismo, o Purebreak te ajuda a entender as origens desse sistema, o que ele representa, seu funcionamento e a importância na prática. Vamos lá?
A Índia foi o primeiro país a implementar o sistema de cotas por volta de 1950. Pouco tempo após a independência, o país, por meio da constituição, criminalizou o sistema de castas e implementou a política de ações afirmativas para reverter injustiças históricas, econômicas e sociais contra determinados grupos. Mas é claro que, infelizmente na prática, ainda há muita retaliação em jogo. Assim como no Brasil, né?!
Em duas palavras: reparação histórica. Diferente das cotas sociais, as raciais são as que mais geram polêmica na nossa sociedade. Há uma ideia no senso comum de que isso é uma forma de excluir ainda mais a população negra ou, ainda, de ser uma forma de preconceito contra os brancos - sobre isso, o Purebreak já explicou que "racismo reverso" não existe.
As cotas raciais nada mais são que uma forma de compensar grupos étnicos vulneráveis ao longo da história. E esses grupos sabemos muito bem quais são, certo?!
É preciso ter em mente que a abolição da escravatura no Brasil foi mais uma atitude formal do que prática. Pessoas escravizadas não receberam nenhum subsídio para se reinserirem na sociedade. Durante muito tempo, inclusive, não podiam sequer frequentar determinadas instituições de ensino, além de ficarem submetidas a condições deploráveis de trabalho por falta de opção e por um pensamento colonial da sociedade.
Sabe o que isso significa? Que os bisavós de muitas pessoas negras não eram considerados nem como indivíduos, não tinham nenhuma posse ou renda para garantir a educação dos seus filhos, netos e assim por diante até os dias atuais.
A população negra é ainda a que tem menos acesso ao ensino. Apesar da taxa de analfabetismo entre negros com 15 anos ou mais ter diminuído nos últimos anos - passou de 9,8% em 2016 para 9,1% em 2018 -, o número segue sendo maior que o dobro da população branca analfabeta (3,9% considerando o mesmo período e a mesma faixa etária, segundo a Pnad Contínua de 2019).
Segundo o último censo do IBGE, 56,10% da população brasileira é composta por pretos e pardos. O Brasil é um país miscigenado, é verdade. Mas isso não o isenta de ser racista em sua estrutura.
As cotas então surgem para reparar uma dívida histórica de mais de 500 anos, permitindo que esses grupos tenham acesso à educação de qualidade e empregos públicos.
"Mas e os brancos que também foram privados desses acessos?"
Para reverter esse quadro, temos as cotas sociais, levando em consideração a renda ou não.
Aqui, a UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) foi a primeira universidade a acatar o sistema de cotas, em 2003. Já a USP (Universidade de São Paulo), por exemplo, só foi implementar o funcionamento das ações afirmativas a partir de 2018. Bem recente, né?!
A Lei de Cotas foi sancionada em 2012 pela ex-presidenta Dilma Rousseff (Lei N° 12.711/12). Assim, 50% das vagas em universidades, instituições e centros federais são para estudantes que fizeram o ensino médio em escolas públicas. Dentro dessa porcentagem, um percentual calculado a partir de censos demográficos é reservado para pretos, pardos e indígenas (classificação do IBGE).
Há também a Lei Nº 12.990/14, que reserva 20% das vagas efetivas e empregos públicos de concursos da administração pública federal para candidatos negros.
"E como é feita a avaliação?", você deve estar se perguntando, né?!
As cotas sociais requerem documentos comprobatórios. Já as raciais são por meio da autodeclaração, podendo passar por uma banca avaliadora ou não, dependendo do caso. É por essas e outas que o sistema de cotas no Brasil ainda é falho, mas isso não significa que ele tem de ser cancelado. Afinal, é o tipo de alternativa que só viria para prejudicar ainda mais a população negra e indígena. Entretanto, precisamos, sim, exigir punições aos que se aproveitam das cotas a partir da autodeclaração para tentar burlar o sistema.
Tá aí um problema grave e que requer conscientização e informação da população. Não é exagero quando dizem que fraudar cota é roubar a vaga de uma pessoa preta (ou indígena), pois, de fato, está impedindo que ela tenha acesso ao que é dela por direito.